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domingo, 20 de maio de 2012

GASTOS PÚBLICOS: Arrecadação do ICMS cresce 20,16% , mas folha absorve tudo

A boa notícia: no primeiro quadrimestre deste ano a arrecadação do Estado com ICMS cresceu 20,16%, no Rio Grande do Norte, em comparação ao mesmo período de 2011. Isto representou R$ 1,169 bilhão nos cofres públicos. E R$ 196.306.842 a mais que no primeiro quadrimestre do ano passado, de acordo com dados da Secretaria Estadual de Tributação. A má notícia: depois de descontados os repasses constitucionais para os municípios e as áreas da Saúde e Educação, o Governo ficou com R$ 444 milhões e, deste montante, 81% já estavam comprometidos com a folha de pessoal, 19% com o custeio das secretárias, sobrando zero para investimentos. 
Aldair DantasLoja de confecções em Natal: o comércio e a indústria respondem por mais de 60% da arrecadação de ICMS no RN e estão entre os que cobram mais investimentos
Loja de confecções em Natal: o comércio e a indústria respondem por mais de 60% da arrecadação de ICMS no RN e estão entre os que cobram mais investimentos


A arrecadação de ICMS bateu recorde em 2011. Somente com este tributo, foram recolhidos R$ 3,1 bilhões, um incremento de 11,76% se comparado a 2010. Em 2011, o Rio Grande do Norte saiu do segundo menor crescimento da arrecadação entre os estados do Nordeste - 2010 comparado com 2009 - para ser o terceiro que mais arrecadou. O salto é ainda maior, de 76,45%, se comparado o desempenho de 2011 com 2006, de R$ 2 bilhões. 

O crescimento, segundo o secretário de Tributação do Estado, José Airton da Silva, se deve ao esforço fiscal, por meio de um novo modelo fiscal. "Não houve aumento na carga tributária, mas sim a  ampliação da base tributária", afirma. O número  passou de 42 mil contribuintes, em 2009, para cerca de 73 mil contribuintes inscritos. 

Entre as mudanças estão a fixação do limite máximo do regime do Simples Nacional, de R$ 2,4 milhões para R$ 3,6 milhões, a monitoração do lançamento fiscal, por meio da implantação do sistema de nota fiscal eletrônica e políticas de incentivo fiscal e cobrança, que possibilitam a competitividade da empresa e adimplência. A retirada do sublimite do Simples, segundo dados da SET, contribuiu para a formalização de em média 1.5 mil contribuintes por mês. "Muitos paravam de faturar para não passar do limite e sair do regime", analisa Airton. 

A previsão para 2012 é que a arrecadação ultrapasse os R$ 3,5 bilhões. Contudo, a situação do Estado "não é ideal porque falta capacidade de investimento em todos os setores", admite José Airton.

De acordo com informações da Secretaria Estadual de Planejamento, o Rio Grande do Norte destinou 81%, ou seja, cerca de R$ 1 bilhão dos R$ R$ 3,1 bilhões que arrecadou com o ICMS no ano passado, para pagar pessoal. A folha de pagamento chegou a R$ 3.479.803 bilhões, em 2011. O restante, 19%, foi empregado, segundo o secretário-adjunto José Lacerda Felipe, para custeio das secretarias. "Não sobra para investimento em obras públicas e outras aplicação. O valor mal chega para o custeio", reconhece o secretário-adjunto de Planejamento José Lacerda Felipe. O secretário adjunto lembra que a folha é um dos principais gastos do Estado. E mesmo que não tenha acréscimo no número de funcionários, há implantação de promoções e melhorias que fazem crescer os valores. 

Recursos são mal geridos, dizem analistas

A destinação da maior fatia da arrecadação do ICMS, que sobra ao Estado, após as transferências constitucionais, para folha de pagamento aponta para um erro de gestão. A avaliação é da vice-presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) Leticia Mary Fernandes de Amaral. A advogada tributarista lembra que não há especificação, por lei, de uso para esse tipo de tributo e que este pode ser usado para pagamento de despesas líquidas, de acordo com a necessidade do Estado.   Contudo é enfática ao afirmar que "não adianta o esforço fiscal, se este não der retorno para sociedade em melhoria na educação, saúde, segurança pública. Se isso não ocorre é porque é mal gerido, a administração é massante", observa Letícia Amaral. A situação, segundo ela, não se restringe ao Rio Grande do Norte. 

A "má administração", analisa o ex-presidente da Federação da Indústria do Rio Grande do Norte (Fiern) Bira Rocha, imputa a redução na capacidade de investimentos - apesar do crescimento na arrecadação no último ano. A equação passa pelo "enxugamento da máquina", a partir de reforma administrativa. "Seria necessário o governo promover auditoria para a redução do quadro de cargos comissionados, da composição dos grandes salários, liquidação do número de secretarias", afirma Rocha, que não crê que o governo promova este tipo de reforma, no segundo ano de mandato. "Se não foi feita no primeiro, permanecerá assim", afirma. 

O atual presidente da Fiern, Amaro Sales, reconhece avanços em relação a política de incentivos fiscal para categoria, por meio do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Industrial do Estado do RN (Proadi). Entretanto, alerta para necessidade de avaliar a aplicação da alta carga tributária imposta ao setor. "Os investimentos tem sido irrisórios, não só para o crescimento da economia, mas em setores fundamentais e básicos, como educação saúde e segurança pública, em todo estado", afirma. 

No Rio Grande do Norte, a industria de transformação, extrativista e o comércio respondem por mais de  60% da participação na arrecadação do ICMS no estado, de acordo com dados da Secretaria de Tributação. Para o setor rural, a carga tributária no Brasil (19,5%) é até três vezes maior que em países da Europa e o Estados Unidos, ressalta o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Rio Grande do Norte (Faern) José Vieira. "Precisamos desonerar o setor. Trocar imposto por geração de emprego e renda, para aumentar a circulação de bens e serviços. E os impostos arrecadados serem usados na boa prestação de serviços públicos, que não vemos acontecer", afirma.

Embora a distribuição e transferência de alguns valores tenham percentuais estabelecidos pela legislação, a diretora do curso de Gestão Pública da Universidade Potiguar (UnP), Tânia Inagaki questiona a impossibilidade de comprovar que estes são realmente empregados. Segundo ela, não há mecanismos, dentro da dinâmica de tributo não específico e frente ao desinteresse do contribuinte em acompanhar o emprego do que é pago na aquisição de mercadorias e serviços. "Até onde é real? Onde esse valor é aplicado? Quais as melhorias em infraestrutura para o estado? Quais as mudanças para a economia?", questiona a professora. Uma educação financeira e fiscal do contribuinte poderia, segundo ela, melhorar a fiscalização. 

Segundo o secretário adjunto de Planejamento, José Lacerda Felipe, não há como mostrar, em valores nominais - apenas com percentuais - como os recursos do ICMS foram empregados.

A vice-presidente do IPBT Letícia Amaral, defende, além da profissionalização do secretariado, o melhor  funcionamento dos portais de transparência e a implantação de mecanismos que identifiquem a destinação dos recursos. "A sociedade deve buscar, à exemplo do impostômetro, a instalação de gastômetros que digam ao contribuinte para onde está indo o imposto que ele paga", afirma.

Imposto serve de "arma" para estimular investimentos

O ICMS, principal fonte de arrecadação do Estado, também é usado para atrair e manter investimentos. O Programa de Apoio ao Desenvolvimento Industrial do Estado (Proadi) é uma das políticas de financiamento que servem a arrecadação tributária. O incentivo é concedido sobre o valor que a empresa deve recolher na apuração final, e pode chegar até 75% do valor a recolher.

O Programa, explica o coordenador de Desenvolvimento Industrial do Estado, Neil Armstrong, se difere das demais políticas fiscais por ser incentivo financeiro. Não há isenção ou redução tributaria. O estado financia parte do imposto que a empresa deve pagar. A política atende 127 empresas que geram cerca de 33 mil empregos diretos. 

A arrecadação de ICMS dessas empresas equivale a R$ 22 milhões. Contudo, 75% é financiado, ou seja, cerca de R$ 17 milhões do que entra nos cofres é usado pelo estado para dar condições para estas empresas pagarem o imposto. "Como essa arrecadação sai na outra ponta como financiamento, o governo acaba não contando com esse valor, para dispor no orçamento", observa Neil Armstrong. 

O Import RN é outra aposta para atração e fortalecimento do Porto de Natal. O programa reduz a carga tributaria de 17% para 2%, desde que a mercadoria seja desembarcada via Porto ou Aeroporto. Neil Armstrong reconhece que o RN está em desvantagem na guerra fiscal com outros estados, mas alerta que é preciso cautela na hora de conceder incentivos fiscais. "Não adianta conceder um incentivo que depois será questionado juridicamente pelos outros estados. Nosso modelo é juridicamente seguro". 

E-commerce

Um incremento na arrecadação do ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) poderá vir das compras realizadas pela internet. A Secretaria Estadual de Tributação estuda formas de realizar a cobrança e aguarda, segundo o secretário José Airton, a aprovação do projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados. Atualmente, produtos comprados pela internet (ou de forma não presencial) são taxados apenas no estado de origem, a maioria no Sul e Sudeste. Desta forma, o Rio Grande do Norte estima deixar de receber cerca de R$ 40 milhões por ano. O valor é a média que a SET espera aumentar a arrecadação de ICMS, quando aprovada. 

"O Rio Grande do norte está em desvantagem nas operações virtuais. Hoje a maior parte das transações de compra e venda de mercadorias na internet partem de estados, como São paulo, que acabam se beneficiando pela inexistência da divisão", observa o secretário estadual de tributação, José Airton.

A ideia, segundo ele, é que em negociações com estados do Sudeste, cuja aliquota é de 17%, 10% seja recolhido para o Rio Grande do Norte. Nas compras em estados do Nordeste esse percentual cairia para 5%. O modelo que será adotado no estado deve seguir os moldes do já implantado no Ceará, onde há um limite que diferencia consumidores de revendedores.

"Há espaços para que o governo reavalie suas políticas fiscal e tributária"

O presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Rio Grande do Norte (Fecomercio-RN), Marcelo Queiroz, analisa, nesta entrevista à TRIBUNA DO NORTE, o impacto da tributação sobre o setor, observa que há necessidade de incentivos e de mais investimentos em áreas como infraestrutura. Confira os principais trechos:

O comércio é uma das principais fontes de arrecadação do ICMS. Como o senhor avalia a carga tributária imposta ao setor?

Em um estado em que a imensa maioria das empresas é micro e pequena, o valor nominal da carga tributária é reduzido em virtude dos benefícios do Simples, nas esferas estadual e federal. Mas, ainda assim, podemos dizer que há espaço para que esta carga tributária caia ainda mais. Ou, por outro ângulo, ainda pagamos imposto demais. Basta verificar a evolução da arrecadação do ICMS, que é a principal fonte de recursos próprios do estado e que sai basicamente do nosso segmento de Comércio de Bens, Serviços e Turismo. Se verificarmos a evolução, desde o início de 2009, ela sempre emplaca percentuais acima do crescimento do setor. No ano passado, por exemplo, o incremento desta arrecadação foi de 11,6%, mais que o dobro dos 5,5% que cresceram nossas vendas! Isso quer dizer que há espaços para que o governo reavalie suas políticas fiscal e tributária. Há espaços, por exemplo, para que possam ser retomados alguns incentivos fiscais e regimes especiais que foram derrubados recentemente.

Como isso onera as atividades?

O imposto maior eleva o custo das empresas e reduz sua competitividade. Sendo menos competitiva, a empresa perde mercado e com isso vê reduzido o seu potencial de geração de emprego e renda.

O RN arrecadou R$ 3,1 bilhões de ICMS, em 2011. Na prática, o comércio tem visto algum benefício fruto do crescimento da arrecadação ou não percebe nenhum impacto?

Vou falar do segmento como um todo. O comércio tem se ressentido de maior segurança e de um tratamento fiscal mais justo com determinados setores. O setor de turismo carece de melhor infraestrutura e mais divulgação do destino. Nossos colaboradores precisam recorrer a serviços de saúde, educação e lazer oferecidos pelo Sistema S, notadamente o SESC, porque a oferta desses itens pelo Poder Público ou é pífia ou sequer existe.

Atualmente, o percentual que cabe ao Estado é gasto quase na totalidade com a folha de pagamento, não sobrando para investimentos - o que não é um fato isolado no RN. Como o senhor avalia esse quadro? Como estes recursos poderiam ser investidos para melhorar a economia do Estado?

É mais uma prova que os governos, de uma maneira geral, precisam fazer seus deveres de casa. Não adianta aumentar a carga tributária. E é bom ressaltar que este aumento pode se dar elevando alíquotas ou simplesmente apertando ainda mais a tributação, ou ainda pondo fim a incentivos benéficos à atividade produtora. Se não houver austeridade no controle da máquina pública não há arrecadação que chegue. O Estado, de uma forma ampla, no Brasil, custa muito caro aos contribuintes nacionais.
fonte: tribuna do note

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